Por Gabriela Bazzo A Rede Brasil do Pacto Global promoveu, no dia 21 de março, em São Paulo, o Workshop Desafios e Oportunidades em Ações Coletivas de Combate à Corrupção.
Por Gabriela Bazzo
A Rede Brasil do Pacto Global promoveu, no dia 21 de março, em São Paulo, o Workshop Desafios e Oportunidades em Ações Coletivas de Combate à Corrupção. O evento, que reuniu cerca de 60 pessoas no Conselho Regional de Administração (CRA-SP), é a primeira atividade dentro do Collective Action Project – projeto que vai até junho de 2018, e que acontece simultaneamente em mais três redes locais do UN Global Compact: Nigéria, Quênia e Japão.
“O evento marca um capítulo que estamos abrindo hoje. É uma grande oportunidade de aprofundar o diálogo de combate à corrupção de uma forma estruturada, identificando desafios e trabalhando soluções”, afirmou André Oliveira, presidente da Rede Brasil do Pacto Global e Diretor Jurídico e CCO da BASF América do Sul (foto abaixo), enfatizando ainda que o Grupo Temático Anticorrupção é um dos mais ativos e dedicados da rede.
“Nossa ideia é identificar desafios cruciais, buscar soluções e compartilhá-las e capacitar principalmente as pequenas e médias empresas, que por conta de suas estruturas menores acabam tendo mais dificuldade nessa área”, disse, referindo-se ao décimo princípio do Pacto Global.
Reynaldo Goto, Coordenador do GT Anticorrupção da Rede Brasil do Pacto Global e Diretor de Compliance da Siemens, falou a respeito do projeto. “A ideia aqui é tentar estabelecer uma nova ação coletiva dentro do Brasil em função das demandas que nós temos. Nesse primeiro workshop, a ideia é fazer um grande mapeamento sobre os desafios do momento”, explicou.
A iniciativa tem como objetivo principal implementar uma plataforma de aprendizado e diálogo para combater a corrupção no setor privado e, para isso, trazer stakeholders relevantes para identificar desafios cruciais e modos de solucioná-los de forma coletiva.
“Nós estamos vivendo, talvez, um dos momentos mais importantes da nossa história enquanto país e enquanto sociedade. Mas ao mesmo tempo tenho plena convicção que somente superaremos esse momento difícil se atuarmos juntos. O problema do Brasil não é a construção civil, não são os trens, não é a carne. O problema do Brasil é a corrupção”, destacou Oliveira.
Ao longo do dia, os participantes acompanharam discussões em torno da agenda regulatória, dos desafios, dos esforços coletivos e das ferramentas, plataformas e oportunidades no combate à corrupção.
Claudia Taya, secretária de Transparência e Prevenção da Corrupção do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (foto acima), enfatizou a importância de incluir as empresas de pequeno e médio porte no processo de combate à corrupção. Para isso, ela conta que a Controladoria-Geral da União aposta nas parcerias com o Programa Empresa Íntegra, do Sebrae, para se aproximar do setor. “A corrupção é uma via de mão dupla, e para todo o corruptor há um corrompido”, detalhou ela, sobre a importância de que os programas de combate à corrupção sejam amplos, contemplando tanto o setor público quanto o setor privado.
A visão de Taya foi reforçada pela Secretária do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Casa Civil, Patrícia Audi. “O combate à corrupção é uma ação coletiva. Não existe um protagonista, um único responsável”, disse. Ela ainda apontou avanços no combate à corrupção no país. “O Brasil vem, sim, fazendo a sua parte e dando um grande exemplo ao mundo com relação ao combate à corrupção”, comentou Audi sobre a Operação Lava Jato, responsável por prender políticos e empresários – algo que seria considerado impossível pela maioria dos brasileiros há poucos anos.
Ela ponderou também sobre a importância de que o sistema político brasileiro seja repensado, e que o combate à corrupção permeie todas as politicas públicas. “Não adianta mudar os atores e a gente não repensar uma reforma política que seja eficiente”, comentou.
Reynaldo Goto também engrossa o coro que defende reformas na sociedade brasileira, e vê na educação a principal ferramenta para o combate à corrupção. “Acho que há uma convergência de entendimento ligado à educação básica. O grande desafio é a execução”. O coordenador do GT Anticorrupção também afirmou que não existe saída fácil para o problema e ressaltou a importância de que as empresas invistam no futuro, mesmo diante de um cenário de crise em incertezas.
Roberto Livianu, do Instituto Não Aceito Corrupção, apontou em sua fala que a corrupção não vai ser resolvida por obra do acaso, e que é necessário que haja ação no campo político. “Em 2018 precisamos depurar, porque nossa representação política é deplorável. Não há representação política que legisla para o interesse da sociedade”, criticou. Durante sua fala, o promotor também fez uma série de provocações, como defender o fim do foro privilegiado no Brasil e criticar a prescrição retroativa de crimes, algo que, para ele, arranha a imagem do Brasil perante a comunidade internacional.
Livianu também falou sobre o custo da corrupção, cifra que, segundo ele, é incalculável. “Não dá para saber quanto custa a corrupção, pois a maior parte dos casos não é denunciada, seja porque há medo ou porque não convém. O que sabemos é a ponta do iceberg”, afirmou.
A importância da ação coletiva no combate à corrupção também foi abordada no workshop. Segundo Paula Oda, do Instituto Ethos, o esforço coletivo é considerado um fator de mudança de políticas públicas e de comportamento. Em sua exposição, no entanto, ela também apontou a importância de que acordos que discutam especificidades de cada setor também sejam postos em discussão. Representante da Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde (Abimed), Carlos Goulart também trouxe exemplos de como a autorregulação dos setores é um caminho no combate à corrupção.
Durante as discussões entre os participantes, outras sugestões vieram à tona, como a criação de mecanismos governamentais que obriguem as empresas a adotarem mecanismos anticorrupção, e até mesmo a elaboração de um manifesto – encabeçado pela Rede Brasil do Pacto Global – para ser enviado ao Congresso Nacional.
Plataformas e Academia
A última rodada de discussões da tarde foi destinada a explorar as possibilidades de combate à corrupção por meio de ferramentas, plataformas e oportunidades. Representante do Insper, a criminalista Marina Coelho comentou sobre a importância de discutir o tema em cursos como o de compliancee aliar aspectos teóricos e práticos. “Nós precisamos adequar políticas e práticas à realidade brasileira. Não adianta apenas estudar casos de fora, a realidade brasileira é única e o conhecimento técnico é muito importante”, comentou.
Representante da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) e pesquisadora da USP, Agatha Camargo dividiu com os participantes sua experiência de campo. “A falência do ponto de vista moral que acontece na sociedade brasileira também acontece nas organizações”, comentou a estudiosa, que se disse preocupada com o que se chama “mutismo moral e silêncio moral” evidenciado pelo baixo índice de denúncias e relatos nas grandes empresas. “A gente está encabeçando uma mudança cultural que pode, do ponto de vista da sustentação, ser muito frágil, e isso pode ser ‘para inglês ver’”.
Alessandra Gonsales, do LEC – Legal, Ethics and Compliance – afirmou que a reeducação deve começar nas pequenas ações do cotidiano, como o simples fato de sempre usarmos o cinto de segurança, apenas levando em conta o respeito à vida.
“É triste, mas vivemos em uma sociedade corrupta”, finalizou Marina Coelho. “E, enquanto isso existir, vai ser difícil de minar a corrupção dentro de empresas”, afirmando que a mudança deve impactar todos os pilares da sociedade, não apenas o mundo corporativo. “A gente não vai mudar uma história de 500 anos em dois. Muitas vezes a gente precisa começar a fazer do zero, e o zero não vai ser o perfeito, mas sim o melhor possível”, completou.